- Opa! E aí?
Olhei pros lados e não vi ninguém. Em plena hora do almoço e na porta do serviço
me aparece um doido. Ou vendedor. Ou um vendedor doido. Ignoro.
- Pô Guilherme!
Talvez seja comigo mesmo. Melhor responder.
- Opa!
- Porra, cara, como você some assim? Tá sumido demais.
Quem é esse cara?
- Ah, coisas da vida né?
- E aí, tá aqui na Afonso Pena 4000 ainda? Tem um tempo que você tá aqui né!
- Tô né? – Tenho que descobrir quem é esse cara – E você? Tá
onde?
- No mesmo lugar.
Fudeu. Nenhuma pista.
- Bacana.
- E aí? E o namoro?
Olho pra mão dele e tem aliança.
- Tá bom demais, cara, valeu. E o casamento?
- Bem demais, valeu.
- Bacana. – coço a barba. Silencio constrangedor.
- E teu time? Que merda foi aquilo domingo, cara? Time
feio demais. Respeita o líder porra.
Olho com ódio pro cara. Tento o fazer sufocar usando a
Força, mas em vão. Chego
a fazer aquela mãozinha de Lego discretamente para ver se o enforco, mas lembrei
que não sou Jedi.
- Mineiro né. Grandes merdas.
- Ah, desculpa isso hein. Mas aqui, você não sabe quem eu
encontrei sábado. Chuta aí.
- Sei lá.
- Anda, chuta aí.
Não sei nem que é você, quem dirá quem encontrou sábado.
- Sei lá, cara. Fala aí.
- Pô, cara. O Vitão! Trabalha no seu prédio lá!
- Bacana hein.
Olho no relógio. E penso que ele vai desconfiar que não o
conheço. Ele insiste.
- Cara, mas que bom te encontrar. Tava precisando
falar com você.
- Eu tô meio com pressa, cara...
- É sério, Guilhermão!
Fiquei preocupado. Melhor ouvir o cara.
- Fala aí.
- É muita coincidência, cara, eu encontrar você aqui. Justo agora.
- Cara, to preocupado. Fala aí.
- Então, vamos sentar ali ó. Quero te pedir um favor.
Olho pro lado e vejo duas cadeiras. Imaginei que ia pedir
algo. Como não faço ideia de quem seja, é hora de fazer hora com a cara dele. Como
Michael Corleone, sento na poltrona devagar, puxando a barra da calça um pouco
pra cima e cruzo a perna e descanso as mãos. Ergo um pouco o braço direito,
apoiado nos cotovelos e com o dedo indicador e o dedo médio juntos, faço um
movimento pra ele continuar e encosto a mão no rosto.
Assim. Mas de calça jeans, camiseta e sem gel no cabelo. |
- Bom, na verdade, eu fiz uma merda com sua colega de trabalho e queria que você conversasse com ela pra mim, pra ela me
desculpar. Até falei com o Pedro, do 4º andar, mas ele não conseguiu nada. Me
ajuda, cara, pago até seu almoço.
Na mesma posição, levanto apenas a mão direita.
- Por que foi até o Pedro? Por que não veio até mim
primeiro?
- Cara, eu preciso de ajuda.
- Nós nos conhecemos já. Já conversamos algumas vezes e não
consigo me lembrar da última vez que você me convidou para tomar um café ou uma
cerveja. Sejamos francos aqui: você nunca foi meu amigo.
- Calma cara, eu to em falta, eu sei.
- Mas, agora, você vem até mim e diz “Guilherme, me ajude”.
Mas você não pede com respeito. Você não oferece sua amizade. Você nem mesmo me
chama de padrinho. Ao invés disso, você vem até onde trabalho e pede para que
eu te ajude em troca de comida.
- Eu só preciso da sua ajuda.
Me levanto da cadeira.
- Se você viesse até mim em amizade, essa menina te
perdoaria hoje mesmo.
- Você vai me ajudar, amigo?
Penso em estender a mão e aguardar que ele beije minha mão
e me chame de padrinho. Mas na porta do serviço não seria legal ver essa cena.
- Bom. Algum dia, e este dia pode não chegar nunca, eu vou
lhe chamar para fazer um serviço para mim. Mas, até este dia chegar, aceite
esta ajuda como um presente meu.
- Obrigado! Obrigado!
Ele se levanta e me abraça.
- Prego!
- Oi?
- Nada não, esquece.
- Eu sabia que você ia me ajudar. Afinal, meu grande amigo
Guilherme Ribeiro não poderia me deixar na mão.
A ficha cai. Existe um outro Guilherme que trabalha no
mesmo local que eu. Possivelmente teria que convocar uma reunião com o chefe da Famiglia Ribeiro e das outras famílias para rirmos juntos.
- Manda um email pra mim falando quem é, a merda que você fez e o que quer que eu
faça que eu te ajudo.
- Valeu, viu?
- De nada.
- Ah, a propósito. Desculpa por aquela mancada no fim de
ano. Vacilei contigo.
- Tranqüilo.
- Brigadão, cara. Você é gente boa demais.
- Vai com Deus aí.
Guilherme Cunha. Ex-advogado. Futuro escritor. É apenas mais um trabaiadô,doutô. Mais um nerd gordo que acha que é blogueiro. Apreciador de boa cerveja, boa música, boa conversa e de paciência Spider. Melhor jogador de War com as peças verdes. Siga-o no twitter: @guijermoacunha
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