É, eu sei que estou sumido.
Na verdade, estou igual aos ex-BBB’s: Envolvido em alguns
projetos por aí. E acreditem, minha vida tá corrida. Estou fazendo um curso
pela manhã, trabalhando à tarde, estudando à noite e fazendo caminhadas nos
momentos possíveis (como ir da minha mesa até o restaurante, do ponto de ônibus
até a minha casa, ou da minha mesa de estudos até o banheiro).
Por isso, graças a Deus – e à legislação trabalhista
vigente – consegui uns dias de férias. Não foram muitos, porém necessários para
que conseguisse dormir um pouco mais do que as 06 horas nas quais meu corpo
descansa.
Aproveitei esse momento para dormir, estudar, dormir,
comer, dormir, assistir a filmes, dormir e me atualizar nas séries do NetFlix.
Mais precisamente: Demolidor.
E então, vendo os episódios, um sentimento, ou melhor, uma
frustração que por anos esteve adormecida em mim, saiu das sombras e resolveu se
revelar: Eu não tinha uma jaqueta de couro.
Sempre quis ter uma. O Indiana Jones, o James Bond, o MelGibson, o Bruce Wayne, o Wolverine, os Beatles. Todos têm. Mas eu não queria a deles (talvez a
do arqueólogo), mas uma em especial.
Eu queria uma jaqueta de couro de mafioso.
Aquela jaqueta que quando as pessoas olhassem nas ruas já
imaginariam que eu estava recolhendo o pagamento pela proteção dada, ou fruto
do crime organizado. Como os capangas e asseclas do Rei do Crime, das histórias
do Demolidor.
Saí já planejando como iniciar meu Império do Crime nas
ruas de Belo Horizonte. Me imaginava usando uma camisa social, calça jeans e
botas, todos pretos, andando com minha jaqueta de couro e óculos escuros, sendo
conhecido como o Comendador do Crime. Já comecei até a treinar uma voz rouca,
misturando o Don Vito Corleone com o Darth Vader.
Obviamente precisava de uma jaqueta de qualidade, que
atendesse ao meu exigente padrão de elegância e discrição. Fui ao local mais
apropriado de Belo Horizonte para adquirir minha indumentária maligna: O
Oiapoque Mall (ou Shopping Oi).
Para quem não conhece esse complexo de compras belo-horizontino,
informo que é um shopping temático. Além de praticamente todos os stands de
lojas serem dominados pelos asiáticos, o local parece Pequim, pois tem um contingente
populacional similar ao da capital chinesa, um cheiro de pastel que atravessa
ruas e uma velocidade média de caminhada próxima a 0,1 km/h .
E nessa Chinatown mineira, percorri os estreitos
corredores até encontrar um stand especifico para jaquetas. Uma moça se
aproximou e já fiquei imaginando qual seria a senha para ter acesso a uma sala
secreta, na qual conversaria com um contrabandeador que me mostraria os
produtos de qualidade superior.
- Posso ajudar?
- Claro. Procuro jaquetas de couro.
- Tá gripado, moço? Tá com a voz estranha... Mas pode vir
aqui comigo.
Fiz uma anotação mental para melhorar minha rouquidão.
- Obrigado.
- Olha essa, aqui moço.
Era uma jaqueta bonita. Nitidamente couro sintético.
Aliás, só sintético mesmo, nada de couro.
- Nosso couro é diferenciado, totalmente sustentável e
importado.
Pensei em rir dela e dizer que o Comendador do Crime não
poderia ser conhecido por usar couro sustentável. Seria ridicularizado no
encontro das famíglias do crime.
- Tem outras?
- Olha essa.
Era uma boa jaqueta, bonita, com bolsos na frente e zíperes
prateados. Vestiu bem, mas na escala de mafiosos eu estaria mais próximo do
Fredo Corleone do que do Vincent Mancini do Andy Garcia. Aliás, qualquer um dos
membros da Quadrilha de Morte da Corrida Maluca teria mais cara de mafioso do
que eu.
- Uai, moço, ficou boa hein!
- Sei não.
- Sério. Tá ótima.
- É a única que tem?
- Tem essa aqui, oh. Da coleção do ano passado.
Achei! O Graal das jaquetas. O elo perdido dos casacos de
máfia. Era como eu queria. Gola larga, bolsos grandes, possivelmente com um
canivete no bolso direito. Vesti a jaqueta aos poucos, o tamanho no punho
estava perfeito. Ajeitei a gola pra cima e quase pedi um cigarro pra um
transeunte que passava apenas para acendê-lo, comprimir os olhos e falar com
o olhar estilo Clint Eastwood. “Quer sumir da minha frente ou terei que meter
uma bala na sua cara?”.
Era uma jaqueta assim. Até o De Niro teria medo de mim... |
Porém, a jaqueta não fechava. Tentei umas três vezes, mas
não consegui.
- É, acho que essa ficou apertada né, moço? Pior que não
tenho dela maior, não.
Eu não conseguia acreditar. Eu, o Comendador do Crime,
vencido por estar acima do peso. Vi meu Império ruir em segundos simplesmente
porque eu estou gordo.
- Certeza? Não tem tamanho GG não?
- Não. Só essa G e uma M.
Malditos orientais magrelos.
- Tudo bem. Fazer o quê.
Certeza que o FBI e a Polícia Federal brasileira
respiraram aliviados com o fim do meu Império. Estava acabado o Comendador do
Crime.
- Leva a outra, ficou boa. E é de couro legítimo.
Mesmo sabendo que não era couro – ou talvez fosse de uma
espécie que possui couraça sintética no corpo e que habita na China – resolvi
ficar com a jaqueta.
- Vou levar. Vocês parcelam esse valor?
- Sim. Em até três vezes.
- Três? Faz em cinco vezes não?
- Não. Só três. As operadoras de cartão de crédito cobram
taxa para parcelamento acima de três parcelas.
- Tudo bem.
Paguei a jaqueta, coloquei na sacola e fui embora pra casa
sabendo que além de perder meu Império pra gordura, era explorado por outra
máfia.
A das Operadoras de Cartão de Crédito.
Guilherme Cunha. Ex-advogado. Futuro escritor. É apenas mais um trabaiadô,doutô. Mais um nerd gordo que acha que é blogueiro. Apreciador de boa cerveja, boa música, boa conversa e de paciência Spider. Melhor jogador de War com as peças verdes. Siga-o no twitter: @guijermoacunha
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