Roubaram meu Sonho de Valsa.
Só quem gosta de chocolate, como eu, sabe o ódio que isso
dá e sobre como obedecer ao mandamento “Não Matarás” é difícil nesse momento.
Ganhei um Sonho de Valsa de uma colega de trabalho, mas no
momento em que fui presenteado, havia acabado de escovar os dentes. Resolvi,
então, guardá-lo para um momento oportuno.
Eu sei que passaram-se seis dias e lembrei do tal Sonho de
Valsa quando quase comi a mão da minha vizinha de mesa - que ostentava um Lollo
– tamanha vontade de comer um doce.
Calmamente, feito um fumante que retira um cigarro do seu
maço e o acende com um zippo – no estilo James Bond da década de 70 -, abri
minha gaveta com todo garbo, elegância e salivação para poder degustar aquela
iguaria que me acalmaria, mas não achei.
Então, alterando minha postura para aqueles viciados que
reviram gavetas atrás de um trocado ou para achar o resto da droga que os
consomem, revirei minha mesa e não achei vestígios.
E comecei a suar frio.
Precisava daquela dose. Aliás, era a dose ideal para tirar
o gosto de frango que restou do almoço e recompensar meu estomago por aceitar
beterraba, vagem e couve-flor durante a refeição.
Como um lord inglês, afastei minha cadeira pra trás,
descruzei a perna, pigarreei para a voz sair mais limpa e, calmamente, disse:
- Ô Carái, sô! (sou mineiro mesmo) Quem foi o viado que
comeu meu Sonho de Valsa? Saporra tem 1 minuto para aparecer aqui!
As pessoas ao meu redor olharam assustadas e depois se
entreolharam. Mas permaneceram em silêncio.
- É sério viu! Mexam com minha caneta, no meu teclado, no
meu computador e até nas minhas planilhas! Mas não mexam com minha comida! É
foda viu...
E o silêncio continuou.
Mas isso não podia ficar assim. Respirei fundo, esfreguei o
rosto, contei até 13 e iniciei as investigações.
Eu sabia onde tinha colocado, então seria o local ideal
para começar as investigações.
Abri a gaveta e fui procurando todos os detalhes. Sabia que
ele estava ao lado do estojo que contém meu kit-TiraBafo (Dentifrício, Escova
de Dentes, Fio Dental, Enxaguante Bucal e Halls Preto) que fica ao lado
direito. Percebi que ele estava ligeiramente deslocado pra direita, e um pouco
pra cima. Concluí que quem pegou era destro pois, se fosse canhoto, a mão
chegaria pelo lado esquerdo e empurraria o kit pra baixo e contra a parede e
não para cima.
Olhei para o lado e reparei que haviam dois canhotos na
sala, os eliminando logo de cara.
Analisei minha gaveta com a luz do celular. Obviamente não
encontraria digitais ou sangue ali. Mas qual não foi a minha surpresa em achar,
depois de separar clipes, gominhas, canetas, cartelas de neosaldina e dorflex, fichas
de cerveja do Bar da Tia Morena e um cabo USB, um fio de cabelo branco.
Isso eliminava mais uma pessoa da minha sala. Restavam
apenas duas pessoas que eram destras e possuíam cabelos brancos.
Olhei pelo chão atrás de pegadas, mas não localizei.
Procurei por algum rastro na mesa e nada.
Levantei da mesa e fui até as mesas dos envolvidos.
Na primeira mesa, falei baixinho.
- Cara, de verdade. Eu sei que foi você. Tá me devendo um
Sonho de Valsa.
- Não fui eu.
- Eu sei que você. Tenho provas suficientes que foi uma
pessoa destra e com cabelos brancos.
- Mas ele ali também é. Dá uma olhada no lixo dele que você
vai achar o papel do bombom.
Boa! Não havia pensado nisso. Era só revirar o lixo de
todos e...
Sem efeito.
Nada foi localizado.
Restou ir a segunda mesa. Falei baixinho de novo.
- Cara, de verdade. Eu sei que foi você. Tá me devendo um Sonho
de Valsa.
- Não fui eu. Esqueceu que só como chocolate branco?
- Faz sentido. Bom, mas não saia desta cidade, posso
precisar de você.
- Oi?
- Nada não. Foi mal.
É isso! Matei a charada. Se o cara da segunda mesa só come
chocolate branco, só poderia ser o cara da primeira mesa.
- Cara, de verdade, devolve meu sonho de valsa.
- Mas não fui eu. Olha meu lixo.
- Já exclui todo mundo e só falta você.
- Juro que não fui eu. Além do que, saí para almoçar antes
de você e voltei depois.
- Bom...
O pior que era verdade.
Não havia ninguém na sala durante o almoço e todos tinham
saído antes de mim e voltado depois.
Comecei a refazer o caminho e tudo que havia feito para ver
em qual momento ocorreu o crime para, então, solicitar as imagens de vídeo pro
pessoal da segurança. Depois era só arranjar um mandado e... pronto!
Colocaríamos o bandido atrás das grades.
No meio da acareação dos fatos, percebi que minha mochila
havia mudado de local e comecei a questionar se haviam roubado, ou melhor,
furtado algo na minha mochila. Puxei o zíper para conferência, comecei a mexer
nos bolsos dela e...
Bom, o Sonho de Valsa estava lá. Instantaneamente, lembrei
que quando havia chegado e verificado o bombom na gaveta, havia escondido na
mochila para que ninguém pegasse.
Completamente sem graça, fechei a mochila, voltei minha
atenção para a minha mesa e coloquei meus fones no ouvido para trabalhar.
Instantes depois, o cara da segunda mesa passou por mim.
- E aí, Guilherme? Como andam as investigações do Caso
Sonho de Valsa?
- Caso Encerrado, cara. Caso Encerrado.
Guilherme Cunha. Ex-advogado. Futuro escritor. É apenas mais um trabaiadô,doutô. Mais um nerd gordo que acha que é blogueiro. Apreciador de boa cerveja, boa música, boa conversa e de paciência Spider. Melhor jogador de War com as peças verdes. Siga-o no twitter: @guijermoacunha
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